Resumo baseado no texto “Paranapiacaba: história e modernidade no alto da Serra do Mar” da Profª Dra. Silvia Helena Passarelli
Do tupi-guarani, Paranapiacaba significa “ lugar de onde se avista o mar” ou “passagem estreita que leva ao mar”. No Estado de São Paulo, Paranapiacaba é também o nome de uma vila, sede do Distrito de mesmo nome, localizada no Município de Santo André. A vila de Paranapiacaba está localizada a cerca de 60 km da capital paulista e a 33 Km do centro de Santo André. Está situada no cume da Serra do Mar, no ponto mais alto do caminho de ferro, a “estrada do café”, construída na segunda metade do século XIX pelos ingleses, estrada que viabilizou o desenvolvimento econômico e social da então Província de São Paulo e, principalmente de sua capital e arredores. A história da vila tem total relação com a implantação e operação da estrada e com a política nacional de transporte.
Por Paranapiacaba, em trens a vapor, o Brasil ingressou na modernidade da vida urbana em contraposição à vida das fazendas, do trabalho assalariado, em substituição ao trabalho escravo; conheceu a precisão do tempo em minutos quebrados , que passaram a ser marcados por relógios ingleses e pela pontualidade das locomotivas que entravam e saiam das estações. A Estrada de Ferro Santos_Jundiaí, construída entre 1860 e 1867, pôs fim ao isolamento do planalto paulista, rompendo as dificuldades de transpor a grande inclinação da Serra do Mar, facilitando o transporte de mercadorias e o contato cultural e comercial com Europa através do Porto de Santos.
Paranaciacaba nasceu como um canteiro de obras, sem planejamento prévio de ocupação e casas construídas de pau-a-pique e sape se misturavam às máquinas e oficinas da estrada. No mesmo ano, atraído pelo grande número de operários que trabalhavam na construção da estrada de ferro, um grupo de comerciantes de Mogi das Cruzes chegou ao local e instalou pontos de comércio e pensões para abrigar os operários da estrada. Dessa forma, deram origem ao núcleo hoje conhecido pelo nome de Morro ou Parte Alta. Contrapondo com a precariedade das habitações, ao longo de toda a linha férrea, sólidos edifícios com base de pedra e alvenaria aparente, cobertos com telhas francesas, protegiam máquinas e vagões e equipamentos da estrada. A fixação da população no Alto da Serra, como os ingleses denominavam o local, não estava prevista nos projetos iniciais da via férrea, no entanto, o clima úmido dos trópicos e a necessidade de conter os constantes deslizamentos da Serra do Mar obrigaram a permanência de operários no local.
A duplicação da estrada de ferro
No final do século XIX, com o aumento da produção café, gerou-se a necessidade de duplicação da
linha férrea em toda a sua extensão. No trecho de Serra, foi implantado um novo sistema de tração, com cinco máquinas potentes que movimentavam cabos de aço contínuos para garantir o transporte de grandes volumes de carga com maior agilidade e precisão.
Ao longo de toda a linha férrea, ocorreu uma dinamização do sistema. Edifícios de tijolos e ferro com projetos padronizados desenvolvidos na Inglaterra, trouxeram um novo desenho para as cidades paulistas. O ferro trabalhado, o tijolo aparente e as telhas francesas passaram a fazer parte do gosto das classes mais abastadas. Mas, por trás dos ornamentos das edificações, a ferrovia trouxe também a pré-fabricação da construção, onde peças de ferro forjadas nos alto-fornos ingleses eram montadas em São Paulo. Assim um único projeto pode ser repetido em diferentes pontos ao longo da linha.
A nova estrutura urbana fixou, definitivamente, os operários no local, mas também trouxe um novo padrão de moradia: ao longo de ruas largas e retilíneas, casas térreas e germinadas construídas de madeira sobre base de pedra, traziam jardins frontais e recuos laterais, ampliando a perspectiva das ruas. A repetição de modelos, a pré-fabricação da construção civil e a adoção de técnicas de saneamento e higiene trouxeram para o planalto a origem do movimento moderno em arquitetura e urbanismo.
Por trás dos edifícios residenciais passagens estreitas permitiam a passagem das redes de saneamento, canalização de água e esgoto que inexistia em muitas das antigas cidades brasileiras. Rede elétrica e um sistema de proteção de incêndio também foram implantados no novo povoado, em conformidade com os padrões de infraestrutura e saneamentos adotados nas novas vilas industriais que surgiram no final do século XIX na Europa e Estados Unidos.
Até a década de 1940, foram construídas na vila ferroviária, cerca de 280 unidades residenciais de diferentes dimensões, todas em madeira e com área construída entre 40 e 140 m2, e ainda os equipamentos necessários para atender os moradores: escola, clube, área esportiva e mercado.
A primeira metade do século XX, a vila assistiu a uma grande efervescência de atividades. Os trens percorriam os trilhos com freqüência. Na estação, a parada obrigatória para a troca de máquinas e a descida da serra, artistas, intelectuais, empresários percorriam as plataformas da estação. A vila de Paranapiacaba pouco cresceu desde então. Apenas um conjunto de casas de alvenaria foi construído ao redor do campo de futebol e ao longo da Rua Rodrigues Alves no início dos anos 1950.
O fim do Dinamismo da Vila de Paranapiacaba
O dinamismo da Vila de Paranapiacaba, intimamente ligado com a vida da estrada de ferro, sofre uma interrupção com a valorização do uso do automóvel: a partir dos anos 1950 o Governo brasileiro investe recurso na abertura de rodovias e incentiva a produção de caminhões, veículos particulares e ônibus que passam a competir com o trem.
Mas, foi na década de 1970, que Parapiacaba perde sua principal função em nome da modernização do transporte ferroviário, um novo sistema de descida da serra foi implantado - o sistema cremalheira-aderência – que já não necessitava de grande número de operários para operar as máquinas suspensas ao longo de toda a serra. Uma Nova estação ferroviária foi construída para o terminal de subúrbio – com a modernidade do concreto e da alvenaria, no entanto, sem o conforto e a facilidade de acesso da antiga estação de madeira que, em 1981 foi totalmente destruída por um incêndio.
O fim das viagens de passageiros para Santos pelo sistema funicular, no inicio dos anos 1980, marca a aceleração do abandono da antiga vila de operários, agora totalmente desnecessária para o bom funcionamento do sistema ferroviário, que deixa de receber a necessária conservação das madeiras num local onde a umidade é freqüente.
Iniciativa de Preservação da Vila de Paranapiacaba
Ferroviários, estudiosos da ferrovia, moradores da Região do ABC e mídia local iniciam um intenso movimento pela preservação da Vila Ferroviária, destacando sua importância para a história do desenvolvimento econômico e social do Estado de São Paulo e para o resgate da tecnologia de transporte no Brasil.
Inúmeras ações são desencadeadas durante os últimos anos do século XX, resultando, de um lado, no tombamento da vila pela CONDEPHAAT, em 1987 e mais recentemente, pelo IPHAN (2002). Ao mesmo tempo, a vila atrai, a cada dia, novos visitantes, em busca de um passado mágico do trem ou de aventuras nas agruras da Serra do Mar e da Mata Atlântica.
Mário Nascimento
Graduando do curso de Bacharelado em Ciência e Tecnologia da Universidade Federal do ABC (UFABC)
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